quinta-feira, 18 de agosto de 2022

Distopia

com tanta tecnologia 

o ser humano desaprende 

a viver


também é muito fácil dar um click e 

miles davis toca, 

sushi se materializa, 

o livro chegou, 

dei match com alguém.


ok google 

casaco ou bermuda? 

ok google 

mudar a cor da sala para verde

ok google 

abaixar o volume do poema 

alexa, 

conte-me uma piada 

alexa, 

pare! Alexa, stop!


basta dar um click e 

não vamos mais ao supermercado, 

teatro, parque, cinema, padaria 

não vamos mais ao trabalho.


mais um click e chega um uber, uma flor, um sofá. 

não nos perdemos mais, thank's waze!


na verdade, estamos completamente perdidos 

perdemos o senso, o chão,

se a bateria do celular acabar 

parece que estamos em coma, ou dormindo 

estamos out! 

offline dessa vida inventada


sem viver os processos 

cada vez mais 

nos tornamos incapazes 

de decodificar sentimentos 

nossa visão ficou egocentrada, turva, 

limitada a uma bolha dentro da bolha, dentro de outra bolha 

como um olho mágico 

do seu apartamento


sentamos na mesa, 

no fundo a televisão 

evidencia a tragédia do interior do rio 

uma enchente deixou oitenta pessoas desabrigadas 

nos limitamos a comentar, que merda! 

Na sequência, a matéria fala sobre a classificação heroica do flamengo 

você viu o que o cretino do bolsonaro falou? olha no meu insta! 

olha esse vídeo do sou eu na vida, muito bom né? 

calma, meu chefe me mandou um whats! espera! 


e assim seguimos! a sobreposição do imediatismo, anestesia o drama que é viver 

enquanto isso, nossa vida é servida numa bandeja.


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